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sexta-feira, 4 de março de 2011

O riacho e a mente


O riacho e a mente

Um dia, Buda ia passando por uma floresta, era um dia quente de
verão e ele estava sentindo muita sede. Disse então ao seu discípulo:
-Volta para trás. Nós passamos por um pequeno riacho apenas cinco ou
seis quilômetros. Traz-me um pouco de água - leva a minha tigela. Estou
sentindo-me cansado e com muita sede.
Ele já estava velho. O discípulo voltou para trás, mas quando lá
chegou, tinham acabado de passar alguns carros de bois pelo riacho,
enchendo-o de lama. As folhas secas, que tinham assentado no fundo,
estavam agora boiando na superfície; já não era possível beber esta
água - estava muito suja. Regressou de mãos vazias e explicou:
- Mestre, vai ter que esperar um pouco. Eu vou à frente. Disseram-me
que uns três ou quatro quilômetros mais à frente há um grande rio. Vou
lá buscar a água.
Mas Buda insistiu e pediu:
- Volta para trás e traz a água daquele riacho.
O discípulo não conseguia perceber a insistência, mas, se o mestre
dizia, ele tinha que obedecer. Mesmo vendo o absurdo daquilo - tinha
que voltar outra vez a andar cinco ou seis quilômetros, sabendo que a
água não prestava para beber -, ele foi. E quando já ia se afastando,
Buda disse-lhe:
- E não voltes para trás se a água ainda estiver suja, tu senta-te
simplesmente quieto na margem. Não faças nada, não entres no riacho.
Senta-te quieto na margem e observas. Mais cedo ou mais tarde a água
vai ficar limpa outra vez e então podes encher a tigela e regressar.
O discípulo lá foi. Buda tinha razão: a água estava quase limpa, as
folhas tinham-se ido embora, a poeira tinha assentado. Mas ainda não
estava absolutamente limpa, por isso ele sentou-se na margem e ficou
observando o riacho a correr, pouco e pouco, o riacho tornou-se
cristalino.
Então o discípulo regressou a dançar. Ele tinha compreendido porque
é que Buda estava insistindo tanto. Havia nisto uma determinada
mensagem, e ele tinha compreendido a mensagem. Deu a água a Buda,
agradeceu-lhe e tocou-lhe nos pés.
Buda perguntou:
- O que é que estás a fazer? Eu é que te devo agradecer por me teres trazido a água.
- Agora consigo compreender - disse o discípulo - primeiro, eu
fiquei zangado; não demonstrei, mas estava zangado porque era absurdo
voltar para trás. Mas agora entendo a mensagem. Era disto que eu
precisava realmente neste momento. O mesmo acontece com a minha mente -
ao sentar-me na margem daquele riacho, fiquei ciente de que o mesmo se
passa com a minha mente. Se eu saltar para dentro do riacho, vou
deixá-lo sujo outra vez. Se eu saltar para dentro da minha mente,
cria-se barulho, mais problemas começam a vir de cima, para a
superfície. Ao sentar-me na margem, eu aprendi a técnica. Agora vou
sentar-me também ao lado da minha mente, a vê-la com toda a sujidade e
problemas e folhas velhas e mágoas e feridas, memórias, desejos. Se me
preocupar, vou ficar sentado na margem à espera do momento em que tudo
fique limpo.

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